Essa é mais uma cronica do meu amigo Antonio Risério que me diverte muito. Ele é genial . Só não sei onde arranja tanta virilidade.
Banalidades, bobagens e besteiras
Antonio Risério
Escrever crônicas, coisa que nunca soube fazer direito, é como escrever memórias. Não me lembro quem foi o sujeito que disse que não escreveria suas memórias porque não era bom "ficcionista". Mas acho a frase esplêndida. Assim como acho esplêndido o que dizia o poeta Waly Salomão, filho de Xangô que celebrava Iemanjá: "a memória é uma ilha de edição".
Bem. São quase três horas da manhã. Capotei cedo hoje, depois de uma noite virada. Re-acordei agora, com uma saudade enorme de uma amiga que está morando no Rio de Janeiro, Lau Alencar. Uma vez, quis escrever um poema para ela. Mas queria que o som fosse de um poema provençal, de um texto occitânico, no Languedócio medieval. Comecei... e não passei de uma quadrinha, que no máximo serviria de "coda" e não estava de modo algum à altura daquelas canções feitas entre os séculos 11 e 13, antes da cruzada contra os cátaros. As canções de Guillem ("farai um vers de dreitz nien"), de Arnaut Daniel, de Marcabru, de Rimbaut d'Aurenga. Sei até cantar algumas delas (como a "chanson do il motz son plan e prim", de Arnaut). Mas fazer é outro papo. A quadrinha para Lau ficou pobre, assim:
Dizem que é de lã
Ou de coisa igual
Olha, ei-la, alva:
É a lua, Lau.
Muito pobre. Não tive pique pra continuar. Agora, quase sem dormir, menos ainda. Saí, ontem, com quatro amigas (Vanya, Balila, Fátima, Clarissa). E acabei trepando com uma moça que não conhecia, que nunca tinha visto, que me disse que se chamava Silvana. Espero que ela não tenha gostado muito, porque eu gostei, mas isso pode ser um problema. E, nesses últimos dias, tenho andado sem saco para tudo. Para as pessoas, a vida, o mundo. E com esse problema agora terrível, que é viver cercado de gente, recebendo convites para mil e uma coisas, boa parte dos quais não posso recusar. Escrevi, então, um e-mail para Lau (não iria telefonar de madrugada). Disse da minha saudade. E tenho mesmo: saudade de seus discursos radicais, de suas indignações impecáveis, mas, sobretudo, de sua carinha e de seus carinhos.
É claro que eu não gostaria de ser sozinho. Ninguém gosta de solidão. Mas também não gosto de ver muita gente. E sou obrigado a ver gente demais. Passaria uma semana bebendo com Vanya, Balila, Fátima e Clarissa, que, aliás, é gaúcha. Mas, infelizmente, o mundo não se resume a elas. Um amigo meu (não, não vou dizer o nome dele), outro dia, numa festa a que não podíamos faltar, me disse, em particular, uma frase maravilhosa: "eu adoro a humanidade, mas não gosto de gente". Entendi perfeitamente o que ele queria me dizer. Acho um porre ter de ficar cumprimentando pessoas, alimentando conversas que não me interessam, trocando abraços compulsórios, "fazendo o social". Já a caminho do final do meu segundo casamento, com a minha tão querida Dulce Maria, que hoje mora na Espanha, na Andaluzia, isto não deu nada certo. Ela insistia para que eu fosse a determinadas festas. Acabei cedendo. Na primeira que fui, encontrei um canalha que me cumprimentou efusivamente. Era pura hipocrisia. Disse a ele que me faria um grande favor se não falasse comigo. Dulce ficou puta da vida, é claro. Criei um constrangimento na casa. Mas disse a ela: é para você ver que é melhor eu não ir a certos lugares.
Ao mesmo tempo, como disse, não gostaria de ser sozinho. A solidão é uma coisa muito estranha. Seria perfeitamente tolerável, admito. Mas o problema é que produz uma coisa bem maior do que ela. Produz uma espécie de falta de sentido que considero apavorante. E não gosto da conversa de quem tenta adoçá-la com sonhos de segunda mão. Ao mesmo tempo, por que, ontem, fui trepar com Silvana? Não sei, também não faz muito sentido, a não ser pelo fato de que ela é muito, muito bonita. Mas e daí? De outra parte, quando meu amigo me disse que adorava a humanidade, mas não gostava de gente, disse a ele: "a solução é comer a Carla Visi". Bem, pra quem não sabe, Carla Visi é uma das lindas e gostosas estrelas do carnaval da Bahia, requebrando maravilhosamente em cima de trios elétricos e, por sinal, cantando bem. E espero que ela me desculpe pela frase infeliz. Mas é que não sei direito o que estou querendo dizer. Fica para uma outra e nova e bela e próxima oportunidade, ok? Até lá, quem quiser que coma outra.
Antonio Risério é poeta e antropólogo.
O cara é bom! Cássia, Silvana, Jorge e Antônio têm sorte em conviver com ele, apesar do preço.
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