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e sobre ele se erguem os rochedos da Urca,
o Pão de Açúcar.
É tudo solidamente real.
Mas e os mortos,
onde estão?
O Vinicius, por exemplo,
e o Hélio? a Clarice?
Não quero que me respondam.
Pergunto apenas, quero
apenas
fundamente
perguntar.
Ia cruzando a sala de manhã quando
me disseram: a Clarice morreu.
E no banheiro, depois, lavando as mãos,
lavava eu as mãos já num mundo sem ela
e água e mãos eram um enigma
de sensações e lampejos
ali na pia.
É que a morte revela a vida aos vivos?
Quando Darwin morreu
fomos todos para o seu apartamento na Rua Redentor.
Ele estava esticado num banco
enquanto eu via
pela janela sobre a praia
um helicóptero
a zumbir na atmosfera iluminada
longe.
Thereza, Guguta, Zuenir,
estavam todos ali e o bairro
funcionava, a cidade funcionava aquela manhã
como em todas as manhãs.
Não era realidade demais
para alguém deixar assim
para sempre?
A caminho do cemitério me lembro
havia uma casa espantosamente ocre
recém-pintada - e até hoje me pergunto
o que há de espantoso numa casa ocre
recém-pintada.
Não sei se devido à quantidade de automóveis
que há na cidade
o surdo barulho das ruas
e os aviões que cruzam o céu,
o certo é que
subitamente
me pergunto por eles.
Onde estão?
onde estou?
O mundo é real demais para alguém pensar
que se trata de um sonho.
"
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