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O carlismo é uma política baiano-nacional nascida de aspirações modernizantes de uma elite regional, nos marcos da chamada revolução passiva brasileira e na perspectiva de um autoritarismo instrumental.
A um mês das eleições municipais em Salvador, dois candidatos, faces da mesma moeda, se destacam nos primeiros lugares na intenção de voto do eleitor soteropolitano: ACM Neto e Antonio Imbassahy.
Digo duas faces da mesma moeda porque ambos simbolizam e significam a sobrevivência de uma política regional, quiçá nacional, denominada “carlismo”.
O que é o carlismo? Esse substantivo sufixado deriva-se do nome de conhecido político baiano, que se destacou por cinco décadas na condição de deputado estadual e federal, prefeito de Salvador, governador da Bahia, ministro de Estado e senador da República – e “desempregado” político (segundo Escariz), nas raras vezes que se alijou do poder.
Na dificuldade de definir tal fenômeno político, comecemos por dizer o que o carlismo não é: não é uma ideologia, uma doutrina, uma teoria ou escola filosófica. Então, que é o neologismo carlismo?
Antonio Carlos Peixoto de Magalhães foi um “homo politicus” na acepção maquiavélica do termo. Aquele que para conquistar e manter o poder é capaz de utilizar de todos os recursos imagináveis (ou inimagináveis). “Os fins justificam os meios”. Porém, isso não é suficiente para compreender ACM, porque (quase) todos os políticos são assim, alguns com maior ou menor competência. O rei do mensalão José Dirceu é um desastroso exemplo do segundo tipo (incompetência).
O cientista político Paulo Fábio Dantas Neto, na douta e culta linguagem acadêmica assim o define: “O carlismo é uma política baiano-nacional nascida de aspirações modernizantes de uma elite regional, nos marcos da chamada revolução passiva brasileira e na perspectiva de um autoritarismo instrumental”.
Vamos tentar “debulhar esse milho”. O carlismo adota, como diretriz, atuação na política partidária institucional, na máquina pública e a sua interface com a atividade econômica privada, sendo uma espécie de “lobby” das grandes corporações nacionais e transnacionais nas suas relações com o Estado brasileiro. Assim, liga-se pragmaticamente com o campo político liberal.
Através da ação e dos vínculos da Administração estadual com o setor privado, isso ao qual se dá o nome de carlismo, será uma tentativa nos marcos do autoritarismo brasileiro, de retirar a Bahia da letargia econômica de décadas, o “enigma Baiano”, que se beneficiará dos ciclos desenvolvimentistas capitaneados pela Ditadura Militar, particularmente o II PND do Governo Geisel – a implantação do Pólo Petroquímico de Camaçari será um marco nos anos 1970. Já na fase democrática, o Complexo Ford será significativa referência posterior.
O carlismo é uma força que vai além do falecido senador, pois está enraizada em vários segmentos da sociedade. Mesmo antes da morte física do criador, a criatura (carlismo) já não dependia da figura do seu líder. O carlismo vai além de ACM, pois se constitui como estratégias adaptativas de uma elite política estadual para se manter e beneficiar-se do poder.
O carlismo está entranhado em muitos setores da sociedade. Daí que não seria errôneo dizer que em torno desse jeito e estilo construiu-se uma “cultura política”.
Podemos identificar algumas características do carlismo. Não sendo ideológico e se organizando dentro da estrutura da administração pública, o carlismo é fisiológico; clientelista; nepotista. Daí a dificuldade em ser oposição: não poder se locupletar da viúva, digo, dos recursos públicos.
O carlismo investe na cooptação de indivíduos investidos de cargos públicos, num processo de arregimentação com recursos do poder. Funciona através de padrão vertical de comando no contato da cúpula com suas bases, municípios e bancadas legislativas; os processos decisórios são realizados na cúpula com base em acordos.
Na sua estratégia de conquistar o poder a qualquer custo, arquitetando o fracasso de um governo que não seja seu, o carlismo age contrário ao interesse público, pois ao sufocar financeiramente a administração municipal de Lídice da Mata e apostar no fracasso do governo Wagner, atua contra a coletividade baiana e soteropolitana.
O surgimento de novos líderes encerrou o ciclo do comando único que prevaleceu por décadas, inaugurando o comando compartilhado. Isso abre a possibilidade de, em havendo conflito de interesses político-eleitoral, representantes do carlismo buscarem alçar vôo próprio, como é o caso do ex-prefeito Imbassahy.
O cientista político Paulo Fábio considera que ACM Neto não se coloca como herdeiro de ACM. Porém, vai querer herdar o espólio, mesmo não se colocando nessa posição. Tenta convencer o eleitorado de que herdou do avô apenas as suas possíveis “qualidades”.
Pode-se falar de um “carlismo pós-carlista”, que é pós no sentido de ser pós-ACM, mas carlista na tentativa de manutenção de todos os elos da organização - no caso de ACM Neto.
Quanto a Imbassahy, há a ambição de se tornar o principal expoente de um “Carlismo do B”, dissidência fisiológica da matriz original.
Reafirmando o que foi dito no início dessa breve comunicação, consideramos que os dois candidatos melhor colocados na intenção de voto nas pesquisas eleitorais de agosto, ACM Neto e Antonio Imbassahy, são faces da mesma moeda. Cabe ao eleitor reconhecer.
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Texto: Juarez Duarte Bomfim - http://www.jornalfeirahoje.com.br/conteudo.php?codcolunista=50&codconteudo=1491 .
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